A falta de conhecimento do familiar acerca da doença torna sua carga ainda maior, pois a família não entende e não sabe como lidar com determinadas situações, o que agrava o estresse emocional do paciente e de cuidadores. Gerando um desgaste físico e emocional, um cansaço que decorre do cuidado continuo que é necessário para com o indivíduo.

O texto abaixo é  parte de uma pesquisa realizada com três famílias de pessoas com esquizofrenia e refere-se a uma das analises realizadas. Para a segurança e anonimato da identidade dos sujeitos foi lhes atribuído na transcrição e análise dos dados em pesquisa, nomes fictícios. Para as famílias foi usada a designação de: Família 1 (F1), Família 2 (F2) e Família 3 (F3). Para as mães foi usado M1, M2 e M3 e para os pacientes foi utilizado P1, P2 e P3 respectivamente.

Conviver com os sintomas que a esquizofrenia desperta no paciente, dificulta a relação e gera um impacto significativo no ambiente familiar, pois as exigências que se tem ao cuidar do indivíduo com esquizofrenia são tão complexas quanto a própria doença (BRISCHKE et al, 2012). Diversos estudos demonstram que a sobrecarga dos cuidadores de pacientes com transtorno mental é grande, Sant’Ana (2011), aponta em sua pesquisa que com a permanência do paciente em casa, a rotina da família passa a ser modificada, e tendo que garantir as necessidades básicas do paciente como: administrar a medicação, acompanhá-lo ao serviço de saúde, fornece-lhe suporte emocional, lidar com suas crises e comportamentos diferentes, coordenar suas atividades diárias, entre outras. A sobrecarga do cuidador envolve aspectos econômicos, práticos e emocionais. Isso porque o envolvimento no cuidador tira-lhe o tempo para outros relacionamentos.

A falta de conhecimento do familiar acerca da doença torna sua carga ainda maior, pois mesmo depois de anos de convivência, a família não entende e não sabe como lidar com determinadas situações, o que agrava o estresse emocional do paciente e de cuidadores (BRISCHKE et al, 2012). Tudo isso gera um desgaste físico e emocional, um cansaço que decorre do cuidado continuo que é necessário para com o indivíduo. Da mesma forma, colabora nesse sentido a pesquisa de Sant’ Ana et al (2011), onde é ressaltada que a desinformação agrava a condição de fragilidade das famílias, o que pode resultar em prejuízo a saúde de ambos, paciente e cuidador.

Saiba mais: Esquizofrenia: a Doença da Loucura

A fase da agressividade dos pacientes é relatada pelas famílias como uma das mais complicadas de ser lidada. É uma fase onde geralmente está se buscando uma regulagem nos medicamentos e a família ainda não encontrou um ponto de equilíbrio com a doença. Em todas as famílias entrevistadas pode-se encontrar falas relacionadas à dificuldade em lidar com os pacientes nessa fase, que aparentemente foi nos primeiros anos de convívio com a doença.

––– “[…] do nada ele não me via como mãe, do nada ele via um monstro e dai vinha dando socos […] ele modificava a expressão do rosto e dos olhos… era puro ódio”.

––– “[…] ele brigava muito com padrasto, queria fugir, ficava agressivo […] nem dava pra reconhecer”.

––– “[…] ele cismava que tinham roubado ele […] uma vez ele quis ir brigar com um vizinho porque achava que tinham pego o carro dele”.

––– “Uma vez ele invocou que o carro do vizinho era dele e tinham roubado, ele tiveram que chamar a policia, veio a policia e levou ele no hospital tomar injeção”.

––– “Ele sempre nervoso, sempre brigando […] ele cismava que tinha caminhão e tomaram tudo dele”.

––– “[…] não posso morar em apartamento, nem de graça, se ele escuta vizinho fazendo barulho tá feita a sujeira, ele quer ir lá e jogar todo mundo pela janela”.

É muito comum alguns pacientes acharem que o remédio é a causa do seu mal-estar, ou que não estão doentes. Familiares também frequentemente interrompem o medicamento por acharem que o paciente está curado, o que acaba resultando numa piora dos sintomas e a ocorrência de novos surtos agudos (LOUZÃ, 1995).

––– “[…] ele não queria tomar o remédio porque ia deixar ele doente, dai brigava”.

O familiar pode perceber um risco de vida devido ao comportamento paranoico derivado dos delírios e alucinações do esquizofrênico, o que acarreta em medo, preocupação e um cuidado redobrado por parte do cuidador (BRISCHKE et al, 2012). Colvero, Ide e Rolim (2004), também destacam em sua pesquisa, que os cuidadores carregam um sentimento de insegurança e desconforto diante de lidar com ações imprevistas que o esquizofrênico pode tomar. Essa insegurança foi verbalizada em nossa pesquisa pela mãe de um paciente.

––– “Eu tinha uma bomba armada dentro de casa, a família só esperava a notícia que o P3 matou a mãe. Era uma bomba armada. Eu fechava bem a porta, botava um trinco de ferro. Aquela angústia, aquele medo sempre, sempre em cima do perigo, 28 anos”.

Muitas famílias não encontram uma forma de lidar com a situação. Aliando o descontrole emocional à falta de informações sobre a doença e um medicamento que não é tomado de forma regular, ou em muitos casos, principalmente na população do meio rural, a uma ausência total de medicação, tornando assim o paciente descontrolado, faz com que familiares tomem atitudes “drásticas” conforme verbalizações:

 ––– “Pra poder trabalhar, ir pegar milho pra dar pra criação, tinha que amarar ele, amarado que nem um boi, então ele não comia, ele não bebia, ele brigava com as parede o dia todo”.

––– “[…] uma tia da avó… ela ficava amarada com correntes por conta da agressividade […] como eles tinham aquelas patente fora de casa, eles adaptaram uma pra ela e colocavam o prato de comida por baixo da porta”.

––– “[…] os dois tios da minha mãe, eles rasgavam a roupa com os dentes, eles eram amarrados e levados de carroça pro médico”.

Essas verbalizações vem de encontro com que já foi exposto anteriormente por Louzã (1995), quando falava sobre a forma que familiares se comportavam no tratamento com doente mental. Souza e Scatena (2005), também colocam a questão dos maus tratos, do abandono, do desinteresse e da rejeição do doente mental, culpabilizando em grande parte a falta de condições financeiras a que estão submetida grande parte das famílias, aliadas a falta de informações. Porém, ressaltando que mesmo em condições de pobreza pode-se encontrar recursos para o cuidado do paciente.

Embora a questão do isolamento e da rejeição que tenha aparecido nas falas, tenha ocorrido em épocas onde o acesso a um atendimento médico era de maior precariedade e de difícil acesso, não quer dizer que hoje ainda não possa ocorrer.

Essa dificuldade que as famílias de baixa renda encontram no tratamento do paciente com esquizofrenia vem de encontro com a fala do Poeta Ferreira Gullar e do Deputado Germano Bonow, citados na pesquisa, quando colocam que deveria existir a criação de novos leitos psiquiátricos, pois as famílias de baixa renda tem pouca, ou nenhuma opção de tratamento. O hospital da cidade onde foi realizada a pesquisa, por exemplo, não possui leitos psiquiátricos e nem tão pouco está preparada para tais atendimentos, então o que resta é o CAPS, e nos casos mais graves, o paciente deve ser encaminhado para outra cidade que possua maiores recursos.

Se você deseja ler o trabalho completo com todas as referências, ou deseja saber mais, basta acessa o link abaixo:

Esquizofrenia: A Relação e o Convívio Familiar com a Doença

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