Com o diagnóstico da doença, é anunciada a morte do filho idealizado. Eis que surge dor, angústia, tristeza, frustração, medo do desconhecido: o luto. Um luto que muitas vezes nem pode ser vivenciado, pois a cobrança das pessoas ao redor por uma ação não dão autorização para o choro da mãe.
O texto abaixo é parte de uma pesquisa realizada com três famílias de pessoas com esquizofrenia e refere-se a uma das analises realizadas. Para a segurança e anonimato da identidade dos sujeitos foi lhes atribuído na transcrição e análise dos dados em pesquisa, nomes fictícios. Para as famílias foi usada a designação de: Família 1 (F1), Família 2 (F2) e Família 3 (F3). Para as mães foi usado M1, M2 e M3 e para os pacientes foi utilizado P1, P2 e P3 respectivamente.
Em vários momentos da vida sofremos perdas importantes. A toda perda é atribuído um processo de luto pelo qual passamos. Kübler-Ross (1996) descreve que são cinco as fases envolvidas nesse processo de luto para reparação da perda.
A negação é descrita como um mecanismo de defesa usado pelo indivíduo para proteger seu ego da verdade. A segunda fase é a da raiva. Fase essa em que os indivíduos projetam suas frustrações em todo o ambiente externo, tentando achar um culpado. Na fase da barganha estão envolvidos sentimentos de culpa e o indivíduo procura por ajuda espiritual, fazendo promessas e propondo trocas, como por exemplo, pedir a Deus uma cura em troca de uma vida dedicada à bondade com os outros. A quarta fase é chamada de depressão. É nessa fase que os indivíduos enfrentam um grande sentimento de perda e de impotência, onde lutar não faz mais sentido. E finalmente a quinta fase, a de aceitação. Nesse estágio o indivíduo aceita a sua condição, passando a entender todo o processo e as fases anteriores como naturais.
Essas cinco fases foram inicialmente descritas para pacientes com doenças em fase terminal, porém, em toda perda que sofremos, passamos por um processo semelhante de reparação. É importante frisar que cada indivíduo é único e por isso reagem de forma diferente. Alguma das fases pode ser transposta ou mesmo serem passadas de forma não linear, pode também ocorrer o retorno para uma fase anterior. Muitos indivíduos nunca chegam à fase de aceitação, passando a vida toda em negação, por exemplo.
Senão todos, a grande maioria dos pais, já durante a gravidez imaginam e até comentam com parentes e amigos o quão perfeito seu filho será. Mil planos passam pela cabeça dos pais que projetam nos filhos seus sonhos, e falta de vivências anteriores (MARQUES, 1995). Todos se preparam para recepcionar um filho saudável, pois ninguém espera gerar um filho que venha ao mundo doente. O filho vem com a missão de fazer uma historia diferente, de conquistar aquilo que os pais tiveram que renunciar (MANNONI, 1988 apud MARQUES, 1995).
A esquizofrenia é uma doença que eclode geralmente na adolescência, uma fase em que os pais não reconhecem mais como uma fase a temer problemas como, por exemplo, uma Síndrome de Down, que é algo muito temido pelos pais, mas pode ser percebida logo após o nascimento.
Saiba mais: Esquizofrenia: a Doença da Loucura
Com o diagnóstico da doença, é anunciada a morte do filho idealizado. Eis que surge dor, angústia, tristeza, frustração, medo do desconhecido: o luto. Um luto que muitas vezes nem pode ser vivenciado, pois a cobrança das pessoas ao redor por uma ação não dão autorização para o choro da mãe (ALVES, 2012). O filho idealizado passa a ser visto como um “brinquedo quebrado”. Por isso é normal encontrar relatos sobre a não conformidade em relação ao paciente que anteriormente era tão brilhante, com projetos de vida e hoje vê-se dependente, desprotegido e cheio de limitações (SANT’ANA, MAZZUCO, 2011).
––– “Meu filho era um reloginho, sempre as melhores notas na escola, várias medalhas, vários sonhos e expectativas e de repente, tudo ruiu…” (M2).
Nas entrevistas realizadas com as famílias pode-se detectar nas falas das mães a questão da vivencia das fases do luto e a perda do filho idealizado. Na F2 a mãe encontra-se na aceitação, ela não nega a doença do filho, sabe muito bem das limitações que ela impõe e procura estimular ao máximo as potencialidades do filho afim de que ele consiga levar uma vida normal.
Já na F1 a mãe encontra-se na fase da negação. Diferente de acreditar que um dia surgirá uma cura para esquizofrenia, ela tem pouco conhecimento sobre a doença e acha que logo seu filho irá deixar de tomar remédios, pois está melhorando aos poucos como pode ser observado na fala dela.
––– “[…] acho que com o tempo mesmo ele fica… bom né!? […] ele tomava vários tipos de remédio e agora já está tomando só um, acho que logo ele não vai precisar mais né!?”
Na F3, a mãe transitou por todas as fases. Atualmente ela se encontra uma hora aceitando e noutra barganhando, frequenta muito a igreja juntamente com o filho, pois acredita que ele melhorou muito, pois segundo ela, ele tinha algo espiritual, “demoníaco” dentro dele.
––– “O pai lá do céu também é pai ele ajuda a gente, como recebi essa benção mesmo desde o primeiro dia que fui naquela igreja. Eu digo que ele podia ter a doença, mas tinha um espirito também, muitos não acredita nisso, mas mesmo as enfermeiras lá me disse: será que ele não tem algum espirito, experimenta. Desde a primeira vez que levei ele já vi mudança. Ele tem uma parte de demoníaco, má. Mas graças a Deus tá tudo calmo, tudo em dia. […] quem sabe o pai véio lá de cima tem misericórdia da gente e faz ele melhorar, porque quem sabe vai aparece um médico um especialista que diz que tem cura. […] eu rezo sempre.”
Autor: Leandro Zanon