É importante um convívio e relação harmoniosa entre paciente e familiares, tanto para prevenção de uma crise, quanto para sua manutenção e recuperação

É importante um convívio e relação harmoniosa entre paciente e familiares, tanto para prevenção de uma crise, quanto para sua manutenção e recuperação. Também é importante que familiares participem de grupos de apoio e psicoterapias. Dessa forma poderão verbalizar seu sentimento de impotência com outros bem como se beneficiar da troca de informações.

O texto abaixo é  parte de uma pesquisa realizada com três famílias de pessoas com esquizofrenia e refere-se a uma das analises realizadas. Para a segurança e anonimato da identidade dos sujeitos foi lhes atribuído na transcrição e análise dos dados em pesquisa, nomes fictícios. Para as famílias foi usada a designação de: Família 1 (F1), Família 2 (F2) e Família 3 (F3). Para as mães foi usado M1, M2 e M3 e para os pacientes foi utilizado P1, P2 e P3 respectivamente.

Tentar continuar a levar a vida da mesma maneira que se levava antes da manifestação da esquizofrenia, é como diz o dito popular, “tentar tapar o sol com peneira”, é estar fadado ao fracasso. Fazer de conta que se é cego, surdo e mudo não é uma opção. Paciente e familiares/cuidadores devem ter em mente o relevante papel que a família tem no processo de tratamento da doença. A aceitação da doença e a busca por informações é fundamental para que familiares possam auxiliar no tratamento do paciente.

O tratamento da esquizofrenia não pode ser realizado como em um transtorno agudo, mas sim como um transtorno crônico, isto é, requer manutenção continua para prevenir as recaídas (HOLMES, 1997). Louzã (1995, p. 72), coloca que:

Conviver e tentar auxiliar um paciente com esquizofrenia exige muito esforço e dedicação, muitas vezes sem uma recompensa equivalente. […] é preciso estar ciente das possibilidades e limitações inerentes à doença, para que se saiba enfrentar melhor os sentimentos negativos (raiva, vergonha, frustração, etc) que ocorrerão ao longo dessa batalha.

 A sobrecarga causada nos familiares frente à relação de extrema dependência material e afetiva, bem como a falta de iniciativa dos pacientes é notória (COLVERO,  IDE e ROLIM, 2004). Por isso, é importante que familiares também participem de grupos de apoio e psicoterapias. Dessa forma poderão verbalizar seu sentimento de impotência com outros bem como se beneficiar da troca de informações.

Comumente achamos que somente nós estamos sofrendo e isso acaba gerando um sentimento de culpa, de estar pagando por algo – um “pecado” que tenha cometido. Muitos familiares relatam que ao participar de grupos de apoio perceberam que existem pessoas em situações semelhantes, outros sentem-se aliviados ao ouvir que existem mais pessoas em situações piores como pode ser ouvir nos relatos:

––– “[…] eu participei no grupo de mães do CAPS, porque dai tu acaba vendo, até heresias né, mas também trocando ideias e experiências […] cada uma coloca um pouquinho do progresso que tem, ai uma ajuda a outra”.

––– “[…] ele vai no CAPS, essas reunião ajuda muito ele. Eu participei um tempo depois não teve mais o grupo de mães. […] era bom porque eu me conformava, porque eu achava que era só eu que sofria, mas tinha gente que sofria muito mais que eu. […] eu lembro daquela mãe que o filho batia nela…”.

––– “Tenho uma cruz pesada, mas tem de mais pesada, de pior. Tem aquela mãe que tem os filhos que se arrasta no chão… […] um de 19 anos que a mãe tem que segurar só no colo, chora dia inteiro, manha, aquela manha, ele quer isso e quer aquilo e não podem dar porque é diabético. […] eu vi que meu sofrimento não era nada perto daquela mãe”.

Diferente de problemas físicos, as doenças mentais além de temidas são ridicularizadas. O doente mental é frequentemente citado como “louco”, “doido”, “retardado” e seguido de uma carga de preconceitos, especialmente a esquizofrenia, que devido ao seu vasto quadro de sintomas, é a doença que mais representa e está associada a “loucura”. (LOUZÃ, 1995). Por isso para a grande maioria, trabalhar parece um sonho difícil de ser concretizado devido às limitações que a doença impõe, e em muitos casos devido ao estigma que está entrelaçado à esquizofrenia, pois muitos pacientes conseguem desempenhar  normalmente suas tarefas, tudo vai depender da intensidade com que a doença acometeu o indivíduo.

––– “[…] ele fala de trabalhar mas, as pessoas não dão serviço pra ele, porque todo mundo conhece ele né”.

Todos os pacientes das famílias entrevistadas estão aposentados por invalidez, embora essa ajuda de custo seja bem vinda para os familiares, muitos pacientes gostariam de poder trabalhar, pois o trabalho nos dá um sentido na vida, nos dá liberdade e identidade, isso é visto na fala do P1 durante a entrevista com sua mãe:

––– “[…] eu queria muito fazer a minha vida, poder trabalhar, sair fora, conhecer pessoas”.

Algo que é visto como um recurso a mais, é o apoio de instituições religiosas, o qual as famílias tem recorrido devido a uma eventual cura espiritual do doente mental (SOUZA e SCATENA, 2005).  Quando não sabem mais a quem recorrer, as pessoas se apegam a fé, por isso a busca por ajuda espiritual é comum, e certamente não vai causar nenhum maleficio, exceto é claro que os pacientes deixem de tomar o medicamento acreditando que apenas a ajuda divina é suficiente, ou que familiares recorram a práticas pouco ortodoxas tais como as de exorcismo por possessão demoníaca. Nas famílias entrevistadas, o que pode-se observar é que a cura do lado espiritual é usado como um complemento a mais no tratamento, ou seja, não vai causar nenhum mal aos pacientes, pelo contrário, trouxe benefícios conforme depoimento das mães.

––– “[…] desde o primeiro dia que fui naquela igreja. […] Desde a primeira vez que levei ele já vi mudança. Ele tem uma parte de demoníaco, má. Mas graças a Deus tá tudo calmo, tudo em dia. […] quem sabe o pai véio lá de cima tem misericórdia da gente e faz ele melhorar […] eu rezo sempre.” (M3)

––– “[…] descobri o espiritismo, me encantei com a doutrina, gosto muito de participar […] melhora nosso controle das emoções […] existe uma vida que acaba agora, mas também tem outra que continua e você pode melhorar. […] Se é um viés que também ajuda, que mau tem?.” (M2)

A reorganização das famílias após a manifestação da doença das entrevistadas deu-se algumas de forma imediata como é o caso da F2, onde a mãe procurou por ajuda e informações logo após o diagnóstico da doença. Embora tenha passado por períodos difíceis, hoje seu filho demonstra levar uma vida praticamente normal. Algo que ajudou, segundo o depoimento da mãe, foi a sua união com um novo companheiro que assumiu o papel de pai do paciente, e este o aceitou plenamente.

––– “[…] família é pai, mãe, filho, ai eu entendi que a referencia masculina era importante porque o que eu não consigo fazer como mãe, tem ele pra ajudar”.

Nesse sentido, podemos entender que a formação tradicional de família nuclear (pai, mãe, filho) colaborou para manutenção no tratamento do paciente. Em contra partida a F2 que também era formada por mãe e um padrasto não ocorria isso, devido a não aceitação da doença por parte do padrasto do paciente, o que resultava em discussões ocasionando elevação do estresse emocional e, consequentemente, novos surtos, obrigando o paciente a deixar sua família de origem e ir morar com uma tia. A situação do paciente só começou a melhorar a um ano atrás (em 2013) quando sua mãe separou-se e assumiu novamente os cuidados do filho. Agora, o que se pode observar diante dos relatos de mãe e filho é que ele melhor muito e tem muito apreço pela sua mãe.

Já a F3 também era povoada por brigas e discussões devido ao não entendimento sobre a doença e seus sintomas, sendo que esse paciente em especial permaneceu, segundo a mãe, por 25 anos vivendo de forma agressiva e sempre estressado. De acordo com o depoimento da mãe, o filho iniciou uma melhora significativa a cerca de cinco anos atrás, período esse que coincidentemente ou não, seu esposo faleceu. Essa hipótese não foi verbalizada pela mãe do paciente nem tão pouco pelo pesquisador na hora, mas é o que parece ter ocorrido, já que o pai do paciente foi citado pela mãe como sendo muito “grosso” e que nunca quis entender a doença do filho.

Todas as famílias entrevistadas relatam que hoje o paciente está bem comparando a anos atrás, ou seja tiveram uma melhora significativa, isso em parte pelo atendimento do CAPS e em parte pelo laço afetivo construído na família.

Autor: Leandro Zanon

Se você deseja ler o trabalho completo com todas as referências, ou deseja saber mais, basta acessa o link abaixo:

Esquizofrenia: A Relação e o Convívio Familiar com a Doença

2 Comentários

  1. Gostei muitíssimo ler sobre o assunto, aconteceu q achei por um acaso, creio nas providências de Deus, pois tenho um filho que toma remédio há 12 anos, tem algumas recaídas. Hj.por exemplo fui ao médico para falar sobre o novo remédio que ele está tomando e sobre uma perícia médica que vai fazer. Fiquei mto.feliz em conhecer esta página, pois os relatos aqui são parecidos com os vividos por nós. Sinto-me, hoje, mais segura e entendendo mais sobre a doença. Deixo aqui o meu testemunho: O que me fortalece é a confiança que tenho em Deus é quem me segura, me sustenta e me faz caminhar na certeza que jamais esmorecerei. Peço sempre muita paciência e sabedoria para enxergar com amor e tolerância. Obrigada a vcs.por abordarem o assunto que ajuda-nos bastante

    • Que bom que gostou da matéria Angela. A esquizofrenia é uma doença bem complexa, por isso sempre chamou minha atenção durante a faculdade e foi o que motivou meu TCC na época. É preciso muita força e compreensão por parte dos familiares, por isso admiro quem consegue seguir firme nessa jornada.

Deixe uma resposta