O Dia dos Namorados é marcado pela tradição da troca de presentes e cartões. No Brasil, o dia dos namorados faz uma referência e presta homenagens ao frei português Fernando de Bulhões, conhecido popularmente como Santo Antônio. A data foi oficialmente aceita no calendário nacional a partir de 1949, quando o publicitário João Dória (pai do atual prefeito de São Paulo) fez uma campanha para uma loja adaptando o Valentine’s Day para a realidade brasileira. Foram os próprios comerciantes que escolheram o dia 12 de junho para a comemoração, pois a data é véspera do Dia de Santo Antônio.

A origem do dia de São Valentim é controversa. Uma versão da Igreja Católica refere que Valentim foi um sacerdote que viveu em Roma no século III, época em que o Imperador Claudius II proibiu o casamento durante as guerras, por achar que os soldados solteiros eram melhores em combate. Mas, o sacerdote continuou a realizar os casamentos em segredo. Quando o imperador descobriu condenou Valentim à morte. Após sua execução em 14 de fevereiro, São Valentim passou a ser o padroeiro dos apaixonados.

Outra versão de São Valentino também viveu sob o império romano. Ele levava uma vida simples e era especialmente bondoso com as criancinhas. Um dia, Valentino foi jogado na prisão pelos romanos por ter se recusado a adorar os deuses deles. Dizia-se que as crianças escreviam mensagens de amor para ele e as lançavam pela janela da cela. Estes foram os primeiros cartões do “dia dos namorados”. Mas não existe nenhum registro histórico disso.

Nem todos os países comemoram o dia dos namorados como nós fazemos. Na Itália, as pessoas fazem um grande banquete no dia 14 de Fevereiro. Na Inglaterra, as crianças cantam canções a recebem doces e balas de frutas de seus pais. E na Dinamarca, as pessoas mandam flores prensadas umas às outras, chamadas “flocos de neve”.

No Japão a data foi introduzida em 1936 e o costume neste dia é as mulheres presentearem os seus amados com caixas de chocolates. Embora a data represente uma oportunidade para as mulheres declararem o seu amor, nos últimos anos o giri choco (chocolate de cortesia ou “obrigação”) também se encontra presente na cesta de compra de grande parcela da população feminina.

O dia dos namorados atualmente

Como em todos os anos, casais de todos os lugares usarão as mídias sociais para fazer declarações públicas de amor à cara metade. Mas, e no dia seguinte? Será que esse sentimento à flor da pele se manterá aceso? Será que a troca de carinho e gentilezas entre o casal romperá as barreiras da data, vista por muitos como “meramente comercial”?

Para a sexóloga, psicóloga clínica e terapeuta de casal, Márcia Atik  só há um segredo para que o amor entre o casal, não só neste Dia dos Namorados, mas todos os dias, perdure: “não esquecer de namorar”.

Na visão da especialista, as relações nos tempos atuais não perduram porque muitos casais transformam o relacionamento, que deve ser algo leve e regado a troca de carinhos, por uma vida “burocrática e cheia de conflitos”.

“Os namoros hoje em dia estão muito ruins. Os casais não andam mais de mãos dadas. Não se abraçam, não se beijam, não aproveitam o tempo de um com o outro”.

Casais jovens

Segundo Márcia Atik, conflitos que antes só surgiam em relacionamentos longos, estão mais latentes entre casais jovens, porque as pessoas querem controlar a vida uma das outras. “E essa relação de posse é potencializada, principalmente, pelas mídias sociais. O namoro acaba se resumindo a se encontrar apenas para resolver conflitos e não para aproveitar agradáveis momentos juntos”, comenta.

A sexóloga lembra ainda que a harmonia entre o casal depende do resgate do “namoro”, que há tempos tem sido deixado de lado. “Não é ter uma visão pessimista dos relacionamentos, mas o meu discurso deve servir como uma reflexão”, alerta.

Marcia afirma que os casais precisam resgatar a alegria do encontro, precisam voltar a sentir saudade. “São coisas simples, como assistir a um programa na TV juntos, se interessar mais pela vida do outro. Os namoros acabam porque o ‘eu e tu’ se perdem no meio do relacionamento”.

A especialista lembra também que, apesar da recomendação para que casais aproveitem a data para refletir a respeito do tempo que passam juntos, as individualidades não devem ser esquecidas. “O segredo é muito simples. As proibições e esse sentimento de posse só existem porque as individualidades dos casais não são respeitadas. Somos nós os responsáveis pela rotina e não devemos deixar com que elas afoguem tudo”

O dia dos namorados em tempos de modernidade líquida

As redes sociais servem de veículo para a carência, com a busca pela aprovação (likes), exposição do que é particular e suposto controle sobre a vida alheia — do(a)(s) namorado(a)(s), por exemplo. Neste cenário de motivações infantilizadas e efêmeras, tanto a diversidade de escolhas ganha mais força e deixa de ficar escondida, quanto a onda conservadora reage de forma mais intensa.

Não por acaso, podemos ver mais pessoas preocupadas em se encaixar. Solteiros podem ficar angustiados e publicar fotos fazendo piada com o fato de estarem sozinhos, namorados podem se sentir mais obrigados ainda a comprar um presente para sua companhia, mesmo que não tenham dinheiro ou não tenham ideia dos gostos do(a) amado(a). Que Dia dos Namorados é este? O que ele diz sobre a sociedade atual?

Rosana Schwartz, socióloga e professora da Universidade Presbiteriana Mackenzie, destaca que a primeira questão sobre os relacionamentos atuais é que o mito do amor romântico está se desconstruindo. Aquele príncipe encantado, a princesa, cultivados pela literatura e pelas histórias infantis, foram perdendo espaço no mundo pós-moderno. “As mulheres hoje mais empoderadas economicamente, no mercado de trabalho produtivo, fizeram com que a gente modificasse as formas de ver, estar e se relacionar com o mundo.”

Outra questão é que várias outras composições dos casais hoje são consideradas algo natural, e antes eram escondidas, como o amor entre pessoas do mesmo sexo e as múltiplas sexualidades. Hoje, temos isso como algo natural, não como uma opção. Várias sexualidades surgem, com formas diferentes de promover a união e a harmonia, e há uma liberdade maior para falar sobre as diversas interpretações que existem em relação ao amor, “o amor real”, e não aquele amor idealizado que nós tínhamos em tempos passados.

O Dia dos Namorados ainda leva a sociedade a uma “obrigação” de presentear seu parceiro e de ter parceiro, o que não tem se sente fora do social. “Mas isso é a relação no mundo do consumo, como o Dia das Mães, quando as pessoas que não têm filhos se sentem mal. A sociedade de consumo é um pouco perversa porque ela mexe, faz com que se tenha desejo de trocar objetos sem pensar no lado humano, nessas pessoas que não têm parceiros.”

“O consumo que vem junto com ele acaba criando o ruído nessa discussão e nesse debate, porque aí a gente direciona mais para o que está consumindo, o que vai comprar, obrigação de presentear, e acaba se endividando. E se não tem o parceiro, cria a insatisfação e muitas vezes depressão e angústia extremamente complexas, esse é o problema maior”, completa.

Aurélio Melo, psicólogo e professor da Universidade Presbiteriana Mackenzie, ressalta que estamos em um contexto onde tudo acontece muito rapidamente, as relações são mais efêmeras e a fidelidade, aposta, é uma coisa em extinção, que não faz muito sentido neste cenário. O que não significa que ela não exista, mas que elas, por exemplo, podem durar menos tempo que em outras épocas.

“Não somos nem fiéis a nós mesmos. Hoje sou uma pessoa, amanhã sou outra, canso do sofá da minha sala e quero trocar por outro, eles estão novos e em bom estado mas tenho que trocar. O amor também é liquido, se liquefaz rapidamente. Eu diria até que o nosso comportamento é cada vez mais modelado pela indústria do consumo, é difícil encontrar alguma coisa que não esteja ligada à questão do consumo, (…) que ao mesmo tempo que molda, cria novos desejos”, explica Melo.

As pessoas estão preocupadas com esse dia, tentando arrumar alguma coisa para o(a)(s) parceiro(a)(s), em um espírito motivado pelo consumo, de que a vida que se quer pode ser comprada. E as pessoas se veem obrigadas a gastar o dinheiro que não têm, mesmo por um relacionamento que sabem que não vai durar.

“Há necessidade de espetacularizar tudo, declarar intimidade em público”, destaca. “Criança é que fala tudo o que pensa. Não e trata de mentir, mas separar, nem tudo que você pensa você fala. De modo geral, as pessoas vêm sendo infantilizadas pelo mundo do consumo, a ideia do consumo também tenta mimar as pessoas.”

“Temos novas configurações amorosas, os papéis são mais temporários, as pessoas transitam mais por vários papéis. Décadas atrás, nos anos 1950, antes da Segunda Guerra, escolhas eram definitivas. Era ‘com quem você vai casar?’. Hoje é ‘com quem vou casar desta vez?’.”, explica. “Os conceitos de modernidade líquida e sociedade espetáculo são muito atuais.”

Celso Figueiredo, professor de Mídias Sociais da Universidade Presbiteriana Mackenzie, acredita que a gente vive uma sociedade muito infantilizada. “Todos nós somos mais carentes, mais dependentes da aprovação do outro, ficamos caçando curtidas e essa sociedade infantilizada, portanto mais dependente, é também uma sociedade que se superexpõe, no instagram, no Facebook, no Twitter, no Tinder, e assim por diante.

Essa superexposição colocada em face da insegurança que a sociedade tem demonstrado “é uma receita de nitroglicerina para qualquer relacionamento”, atesta, porque em um relacionamento maduro, em que as partes são seguras de sua importância para o outro, o fato de um ver que o outro seguiu ou curtiu determinada pessoa não gera abalos ou intrigas.

“Parceiros mais ansiosos, infantilizados no relacionamento começam a perseguir, vigiar o parceiro nas redes sociais, e isso que gera potencial de conflito muito grande, que muita gente está vivendo. A sociedade está infantilizada, e as redes sociais são veículo para isso se materializar.”

 

fonte das entrevistas: Jornal do Brasil

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